Hoje vamos fazer uma pequena análise da Rua Sapucaí segundo
os conceitos que Herman Hertzberger expõe em seu livro "Lições de
Arquitetura"
FORMA:
A mesma forma pode assumir aparências diferentes sob circunstâncias novas, sem que a estrutura mude de modo essencial.
Como exemplo disso temos as intervenções temporárias que o
Viaduto Santa Tereza recebeu durante o CURA (cobras indígenas durante a
intervenção de 2020 e o arco íris de led durante a edição de 2021).
Não é certamente verdade que há sempre uma forma específica que se
ajusta a um objetivo específico. Há formas que não só permitem várias
interpretações como ainda suscitam efetivamente essas interpretações quando as
circunstâncias mudam.
URDIDURA E TRAMA:
A analogia feita pelo autor consiste na estrutura (urdidura) e na intervenção e imaginação exercida no espaço pelo usuário (trama).
Na rua Sapucaí conseguimos ver como o espaço se transforma de acordo com os eventos que ocupam a rua.
POLIVALÊNCIA:
Um mesmo
local com diferentes usos. Na rua Sapucaí conseguimos ver pedestres,
estacionamento, automóveis e uma área destinada às mesas do restaurante
dividindo a mesma espacialidade.
FORMA CONVIDATIVA:
“Este conceito de capacidade de demarcação ou ‘qualidade de lugar’ diz respeito à capacidade variável de um espaço de ser convidativo para grupos maiores ou menores, dependendo de suas proporções e de sua forma” - Atratividade em relação à forma do espaço
Um exemplo observável são as várias intervenções que a escadaria
que dá acesso à Estação Central sofreu no decorrer dos anos. A adição de
grafites acabou por transformar o lugar, que antes era apenas de passagem
rápida, em um espaço de convivência. Os murais servem como fundo para fotos e
são mais convidativos para estar à noite, quando a rua fica movimentada devido
ao funcionamento dos bares.
GRADAÇÕES DE DEMARCAÇÕES
TERRITORIAIS:
“Ao
marcar as gradações de acesso público às diferentes áreas e partes de um
edifício em uma planta,
obtemos
uma espécie de mapa mostrando a “diferenciação territorial”. Esse mapa mostrará
claramente
que
aspectos de acesso existem na arquitetura, quais são as demarcações de áreas
específicas e a quem
se
destinam, e que espécie de divisão de responsabilidades pode ser esperada no
que diz respeito aos
cuidados
e à manutenção dos diferentes espaços, de modo que essas forças possam ser
intensificada
(ou atenuadas)
na elaboração posterior da planta.”
Na Rua Sapucaí isso é percebido nas áreas com bares, visto que há uma demarcação que limita a área do comércio em relação à rua. Geralmente essa diferenciação é feita por meio de grades.
PÚBLICO E PRIVADO:
“Pública é uma área acessível a todos a qualquer momento; a responsabilidade por sua manutenção é
assumida coletivamente. Privada é uma área cujo acesso é determinado por um pequeno grupo ou por
uma pessoa, que tem a responsabilidade de mantê-la. ”É sempre uma questão de pessoas e grupos em
inter-relação e compromisso mútuo, ou seja, é sempre uma questão de coletividade e indivíduo, um em
face do outro.”
"Se, porém, o individualismo compreende apenas parte da humanidade, o coletivismo só compreende a
humanidade como parte (...) O individualismo vê a humanidade apenas na relação consigo mesmo, mas
o coletivismo não vê o homem de maneira nenhuma, vê apenas a ‘sociedade’.”
Ao analisar a Rua Sapucaí sob
essa ótica pensamos no mirante, uma vez que os prédios são de domínio
privado mas suas empenas cegas, ao serem pintadas pelo CURA, acabam formando um grande mural de arte urbana que pode ser apreciado da Sapucaí (que configura um domínio público).
FUNCIONALIDADE:
Tratando de funcionalidade, Hertzberger retrata que um projeto de arquitetura deve atender da melhor forma o que lhe foi proposto, mas não que toda arquitetura funcionalista fosse totalmente eficaz, mas sim aproximar-se da eficiência.
Como exemplo disso salientamos a
presença de binóculos dispostos pela rua para que o pedestre possa ter um
melhor olhar do mural de arte urbana.
FLEXIBILIDADE / IRREGULARIDADE:
"Irregularidades", tais como diferenças de nível, ocorrem em toda a parte, e, em vez de nos esforçarmos em minimizá-las, deveríamos, ao contrário, nos concentrarmos em articulá-las tão conscientemente que possam ser exploradas ao máximo. Parapeitos, balaustradas, pilares e canaletas são formas de articulação e representam maiores possibilidades de conexão. Podem ser usadas como elementos primitivos daquilo que poderíamos chamar a gramática básica da arquitetura. E ao que aparecerem,
como de fato aparecem, em formas e tamanhos diferentes constituem um estímulo constante para o uso na vida cotidiana.
A mureta da Rua Sapucaí subverte
seu uso original de guarda corpo, transformando-se em banco principalmente
durante o período boêmio da localidade, assim como a parte inferior do Viaduto
Santa Tereza (local onde normalmente jovens utilizam como assento).
Flexibilidade significa - já que não há uma solução única que seja preferível a todas as outras - a negação absoluta de um ponto de vista fixo, definido. O plano flexível tem seu ponto de partida na certeza de que a solução correta não existe, já que o problema que requer solução está num
estado permanentemente de fluxo, isto é, é sempre temporário.
Diagrama esquemático da Rua Sapucaí, identificando os pontos com maior presença de pessoas de acordo com a concentração de ruídos
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